Como lidar com o aborto espontâneo?

Como lidar com o aborto espontâneo?

Mesmo em um mundo onde teoricamente falamos sobre tudo, ainda é difícil encontrar espaço para falarmos sobre alguns temas. O aborto espontâneo é um deles. Como lidar com o aborto espontâneo? Embora seja um evento extremamente recorrente, já que isso acontece com cerca de 20% das gestações confirmadas, a maior parte das abordagens sociais são na direção de “passar por cima” da perda e seguir em frente.

O aborto espontâneo se dá quando uma mulher perde um bebê, por causas naturais, antes de completar 20 semanas. Se considerarmos apenas o tempo concreto de gestação, corremos o risco de ignorar a carga afetiva que essa situação pode provocar. A gravidez não pode ser olhada apenas como um processo biológico, os sintomas físicos vão acontecendo em meio à formação de um bebê “sonhado”, já imaginado de alguma maneira muitas vezes antes mesmo da confirmação da gravidez.

LUTO

Alguns autores do campo da psicologia usam o termo “luto não autorizado” para descrever a situação de aborto espontâneo. Esse termo é utilizado porque falamos da perda de um filho que não nasceu ou morreu de forma convencional. É quase como se não tivesse acontecido, é um “não evento”, pois em muitos casos a maior parte das pessoas ao redor sequer sabiam da gestação. No entanto, a experiência de um aborto, seja ela em qualquer estágio de gravidez, deve ser encarada como uma experiência de perda que será vivida de maneira individual, dependendo da intensidade da relação que a pessoa tinha com aquilo que foi perdido – não apenas o bebê, mas um projeto de vida e a possibilidade de ser mãe.

Durante o processo de luto, é importante então que a mulher encontre espaço para ser acolhida e tenha o reconhecimento social de sua perda. Na sociedade atual, tendemos a querer que as pessoas passem o mais rápido possível por suas dores, mas sabemos que acelerar a elaboração da perda pode ocasionar o aparecimento de problemas futuros, como a depressão. É comum que a mulher escute que logo poderá tentar novamente ou que não tem porque sofrer se era uma gravidez tão inicial.  Mas a verdade é que para algumas mulheres essa é uma experiência avassaladora e não encontrar um espaço de escuta pode tornar ainda mais difícil passar por esse momento. Apenas cada pessoa pode dizer do tamanho da sua dor e do tempo que precisa para lidar com esse luto. É um processo e a psicologia pode auxiliar a atravessar esse momento e, quando desejado, contribuir para que a mulher que assim deseja, possa tentar novamente.

CULPA

Um aspecto importante a ser pensado em uma situação de aborto espontâneo se refere à forma como essa perda é compreendida. Como esse é um processo em que muitas vezes não se sabe exatamente o que ocasionou a interrupção da gravidez, é comum que algumas fantasias sejam construídas em torno dos motivos que levaram a esse acontecimento. Muitas mulheres relatam culpa, por acreditarem que fizeram algo de errado. Nesse sentido, é muito importante ter acesso a conhecimento e dados referentes a essa experiência e um espaço para lidar com a impotência que se apresenta nessa situação.

LUTO PATERNO

Outro ponto pouco discutido se refere ao luto que o homem também pode vivenciar a partir dessa perda. Embora não seja uma experiência vivida em seu corpo, da mesma forma que a mulher começa a constituir um “filho imaginado”, o homem que deseja ser pai também faz.

A questão da perda masculina é muito delicada por dois fatores:  primeiramente é difícil encontrar reconhecimento social para essa experiência e, em segundo lugar, muitas vezes  a parceira se encontra muito abalada emocionalmente, provocando a sensação de que cabem aos homens ignorar a própria dor para oferecer apoio e suporte emocional.

O ABORTO E A PSICOTERAPIA

Criar então, um espaço para que o luto seja vivido e “autorizado” é uma das funções que o processo terapêutico pode exercer. Não apenas a mulher, mas também o homem ou familiares devem compreender que podem entrar em contato com o sofrimento suscitado por essa perda e que ao fazer isso, abrem também a possibilidade de elaboração e de passar por essa situação da melhor forma possível.

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